Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Lucas – Naquele tempo, 9Jesus contou esta parábola para alguns que confiavam na sua própria justiça e desprezavam os outros: 10“Dois homens subiram ao templo para rezar: um era fariseu, o outro cobrador de impostos. 11O fariseu, de pé, rezava assim em seu íntimo: ‘Ó Deus, eu te agradeço porque não sou como os outros homens, ladrões, desonestos, adúlteros, nem como este cobrador de impostos. 12Eu jejuo duas vezes por semana e dou o dízimo de toda a minha renda’. 13O cobrador de impostos, porém, ficou a distância e nem se atrevia a levantar os olhos para o céu; mas batia no peito, dizendo: ‘Meu Deus, tem piedade de mim, que sou pecador!’ 14Eu vos digo, este último voltou para casa justificado, o outro não. Pois quem se eleva será humilhado e quem se humilha será elevado”. – Palavra da salvação.
Reflexão:
Nesta parábola Jesus faz uma crítica aos que estão seguros da própria justiça (Lc 5,32; 15,7), que a querem exibir (Lc 16,15). É um apelo à humildade. O fariseu cumpre de fato as práticas piedosas de sua seita (5,33; 11,42) e nisto encontra a certeza da sua justiça. Mas ele não espera nada de Deus. Também o coletor de impostos diz a verdade: ele é pecador, mas esta confissão sincera o abre para Deus e a sua graça. A justiça que o fariseu pretendia adquirir por suas obras, é um dom que só Deus pode conceder.
– Alguns: Lucas não informa quem são os destinatários desta parábola, mas é bem possível que sejam os fariseus que já foram mencionados em 7,36-50; 15,2; 16,15.
– Confiar na própria justiça: A justiça baseada nas condições humanas se opõe à verdadeira justiça de Deus. O Apóstolo Paulo também afirma isso em Rm 10,3; Gl 2,16. É hipocrisia achar-se justo diante de Deus por seus próprios méritos e ainda mais desprezar e acusar os outros.
– Fariseu x publicano: Eles não se diferenciam pela posição social, nem pela fortuna que possuem. Sabemos que os fariseus amavam o dinheiro (16,14) e que os cobradores de impostos enriqueciam à custa do seu trabalho, tantas vezes desonestamente, basta ver o caso de Levi (5,39) e de Zaqueu (19,2). A princípio o fariseu está mais próximo de Deus porque observa a Lei, enquanto o cobrador de impostos trabalha para o império opressor. Sua diferença está no modo como se dirigem a Deus.
– O fariseu: O fariseu da parábola reza com franca gratidão por seu estado espiritual saudável. Não há sinal de que está tentando mentir. Os fariseus faziam um jejum severo duas vezes por semana, às segundas e quintas-feiras, para o bem de toda a nação. E não há razão para duvidar de que pagava o dízimo. A tragédia é que ele não entende a natureza imperfeita dessa oração. Está enganando a si mesmo. Não se considera servo de Deus, mas alguém que merece a graça de Deus por um trabalho bem feito. Além desse orgulho, ele torna-se culpado porque despreza e julga o coletor de impostos. Fariseu significa “separado” e é assim que age: separa-se dos demais. A sua oração divide, separa, julga; diferente é o que ensina Jesus: Ele quer reconciliar, reunir, resgatar (11,2-4).
– O cobrador de impostos: Bem diferente do fariseu é a atitude do cobrador de impostos que está consciente da própria pecaminosidade. Sabe que não merece consideração por causa de nada que tenha feito. A oração que faz é com gestos de humildade: “Meu Deus, tem piedade de mim que sou pecador” (v. 13). Reconhece seu desamparo e sua fragilidade e assim se torna dependente. É esta carência e humildade que abrem a pessoa para a graça de Deus. O próprio Jesus tira da parábola a chocante conclusão: o fariseu praticante vai para a casa injustificado, o cobrador de impostos está justificado.
– Justificado: O cobrador de impostos é justificado no tribunal de Deus. Ele reconheceu sua necessidade da misericórdia de Deus e demonstrou tristeza por seus pecados. O fariseu, entretanto, não precisa do gratuito dom de divino da justificação, pois justificou-se a si mesmo.
– Quem se eleva será humilhado, e quem se humilha será exaltado: Esta sentença de Jesus, usada por ele em outros momentos nos Evangelhos (Lc 14,11; Mt 23,12), condena a orgulhosa segurança dos fariseus (16,15) e convida à humildade. Esta não é uma vingança de Deus, mas revela o modo de agir de Deus, retribuindo a cada um segundo seu agir: quem se exalta está se iludindo a si mesmo; quem, ao contrário, se humilha, dá-se conta da sua miséria e crê que Deus pode e quer exaltá-lo (veja-se o Magnificat de Maria 1,46-48.51-53). Não somos melhores nem piores do que os outros, somos iguais! Se recebemos a graça de podermos seguir o chamado de Jesus, seguir os mandamentos de Deus, nem por isso devemos nos considerar melhores que os outros. “Somos servos inúteis, fizemos apenas o que devíamos fazer” nos ensinou Jesus (Lc 17,10), pois a quem muito foi dado, muito será pedido (Lc 12,48). Portanto, se conhecemos a Palavra de Deus e vivemos de acordo com o que ela ensina, ainda assim não devemos nos orgulhar, pois dependemos sempre da graça de Deus. Nem devemos julgar nossos irmãos, mesmo que sejam pecadores. Devemos e podemos ajudá-los a se aproximar de Deus. O Papa Francisco nos ensina que: “A todos deve chegar a consolação e o estímulo do amor salvífico de Deus, que opera misteriosamente em cada pessoa, para além dos seus defeitos e das suas quedas” (EG 44).